Como a indústria da moda está lidando com os escândalos de abuso sexuais contra as mulheres?

Como a indústria da moda está lidando com os escândalos de abuso sexuais contra as mulheres?

Por Lorena Borges

Precisamos abordar um assunto de grande importância no mundo, estamos em 2018, no tempo de hashtags como #time'sUp e #Metoo e a indústria da moda continua a fechar os olhos para os abusos sexuais.

Virgil Abloh fez sua antecipada estréia pela Louis Vuitton no Paris Fashion Week Men no início deste mês, sendo um desfile épico e de grande importância para a moda, em que fez história como o primeiro negro a desenhar para a casa de moda parisiense com tamanhos elogios por seu trabalho inspirado no streetwear.

Desde o seu abraço emocional com o amigo e colaborador Kanye West, até o seu processo nos bastidores - o show foi um sucesso absoluto, mas não podemos deixar de lado um fator que passou despercebido para a maioria das pessoas que assistiram o desfile. Sentado na primeira fila, estava Ian Connor, uma personalidade/modelo de mídia social com mais de 21 acusações de agressão sexual contra ele.
A primeira alegação veio em 2016 e, desde então, muitas mulheres apresentaram suas histórias em torno do influenciador de mídia social que virou modelo. Esta informação não é nova e como Amber Rose disse: "É inocente até provarem o contrário, mas quando você tem 21 mulheres de todo o mundo que não se conhecem, mas têm histórias semelhantes, chega ao ponto de que só essas informações são o suficiente". Rose havia ajudado as mulheres afetadas pelas ações de Connor, que “supostamente estavam tentando incriminar o jovem, pobre e negro", então elas não denunciaram ele por medo, sentiram que era a palavra delas contra a de uma celebridade rica e bem relacionada. Quem acreditaria nelas?

Não é apenas Ian Connor, que está enfrentando várias acusações contra ele, sentado na primeira fila da Louis Vuitton e 1017 ALYX 9SM, a indústria da moda continua a fechar os olhos constantemente para esse tipo de assunto. O diretor de cinema Roman Polanski, que fugiu do sistema de justiça criminal dos EUA depois de fugir do país enquanto aguardava a sentença por estupro, sentou-se na primeira fila no desfile do Miu Miu Resort 2019. A$AP Bari, que foi flagrado em um vídeo que agrediu sexualmente uma mulher no ano passado, sentou ao lado do A$AP Rocky no desfile Dior Spring/Summer 2019 no Paris Fashion Week Men. Recentemente o grande e renomado fotografo Mario Testino foi acusado por sua secretária e diversas modelos por agressão sexual, a New York Times contou detalhadamente sobre as 13 mulheres agredidas por Mario, que por sua vez negou todas as acusações.

Apesar de todas essas acusações, Testino, e também Terry Richardson e Bruce Weber, que também foram acusados, continuaram sendo contratados por revistas de moda e marcas de luxo. E a lista de acusados não para por aqui, e então por que ninguém faz nada? Por que nada mudou? A industria da moda se importa? O que é preciso para alguém perceber que há algo errado em colocar essas pessoas em um pedestal? Não importa se os designers e influenciadores são bons amigos ou se é somente um problema de Relações Publicas ruins das empresas, apoiar pessoas que foram repetidamente acusadas de agressão sexual, assédio e muito mais coloca a indústria da moda a quilômetros de movimentos como #MeToo e Time Up e até mesmo do que a ela representa de verdade.

Não se trata apenas de emitir uma imagem ruim, mas também força as mulheres e outras pessoas, que são vítimas potenciais de situações semelhantes, a estarem sentadas ou perto deles. É claro e simples: uma mulher não merece se sentir insegura a nenhum momento.
É 2018, e devemos ser capazes de tomar melhores decisões. Onde a linha é desenhada? Fotógrafos abusivos e envergonhados continuam sendo contratados para trabalhos com revistas de renome, designers ofensivos como Stefano Gabbana, que fez comentários homofóbicos e outros estão protegidos por um silêncio de toda a indústria. 

Ao mesmo tempo que deparamos com marcas que não se posicionam, encontramos grandes marcas e personalidades que já tomaram providências e abriram um campo de esperança para o fim desses abusos contra mulheres. Dentre elas temos a YEEZY que decidiu tomar partido e tirar Ian Connor dos seus desfiles - mesmo ainda permanecendo nos círculos mais respeitados da moda -, há rumores que a Supreme desistiu de fazer a atual campanha com o Terry Richardson por conta do escândalo envolvendo o fotógrafo, cancelando uma possível photo tee - camisa com a foto feita por Terry de algum famoso ou personalidade - que seria lançada na temporada de Spring/Summer 2018. O grupo Condé Nast, um dos maiores grupos internacionais de edições de revistas, também se posicionou e vetou de colaboradores regulares de várias revistas, sobretudo da Vogue, fotógrafos, incluindo Terry Richardson, Bruce Weber e Mario Testino, e designers que foram acusados por abusos. Outra boa notícia foi o posicionamento do Conselho de Designers de Moda dos Estados Unidos que além de vetar vários participantes do New York Fashion Week, estabeleceu diretrizes a serem seguidas por estilistas e modelos para evitarem os abusos. “Temos tolerância zero com ambientes inseguros e estimulamos fortemente a todos em nossa indústria a denunciar abusos no ambiente de trabalho” informou a presidente do Conselho, a estilista Diane von Furstenberg.

Modelos famosas, como a brasileira Gisele Bündchen, que também já foi vítima, é otimista quanto as atitudes de algumas marcas e campanhas em face ao problema declarando "Eu acho que é um momento importante para mulheres no mundo. Não é uma indústria. É muito maior. É cultural... é o fim dessa coisa patriarcal: 'só porque sou homem e poderoso, posso fazer o que eu quiser." 

Projetos como RESPECT!, inaugurado no Copenhagen Fashion Summit, na Dinamarca, também tomam frente da solução do problema, com aproximadamente 100 assinaturas de personalidades famosas em uma carta que traz um manifesto relembrando as inúmeras denúncias que marcaram o fim de 2017 e critica a atual situação da indústria.

Infelizmente ainda se encontra em minoria as marcas e personalidades da indústria da moda que se posicionam e tomam atitudes a fim de repelir essas ações, mas está na hora dessa indústria que constantemente desafia e muda a moda pioneirando novas ideias, começar a fazer o mesmo em todos os níveis, pois a moda é um resultado sobre as pessoas e as suas ideias, e isso influencia - e muito - o pensamento daqueles que, principalmente, a seguem - por gostar - e daqueles que trabalham no meio.

Esse é um assunto de grande importância para passar despercebido e nós -principalmente mulheres, mas homens também - temos que agir sempre em prol de erradicar essas atitudes para alcançar o respeito e a dignidade de quem produz para tudo acontecer, a frase "Stop making stupid people famous" (Pare de fazer pessoas estúpidas famosas) fica de maior reflexão.